quarta-feira, novembro 23, 2011

Esportista não é sociólogo!

No mês passado, o humorista Danilo Gentilli entrevistou o jogador Serginho, da Seleção Brasileira de Vôlei, no programa "Agora é tarde", da TV Bandeirantes. Num dado momento da entrevista, Gentilli perguntou a Serginho se ele achava que a Copa do Mundo do Brasil e os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro deixariam um legado de prosperidade sócio-econômica para o Brasil como um todo. Serginho respondeu:

Eu sou da periferia de São Paulo; a rua da casa da minha mãe não tem asfalto até hoje. Depois da Copa e da Olimpíada, a rua dela vai continuar sem asfalto. Então, por esse tipo de coisa, eu acho que não haverá legado nenhum.

Após a resposta de Serginho, Danilo declarou achar interessante que essa negação do legado viesse de um esportista que já foi medalhista e campeão olímpico.

Muita gente pode pensar que Serginho está errado, mas o fato é que ele está certo - de acordo com a realidade dele, é claro. Um esportista, por definição, não é uma pessoa orientada à reflexão, à análise de conjuntura, e muito menos a teorizar sobre o futuro de uma nação e o que se deve fazer para melhorar um país. A inteligência de uma pessoa como Serginho é corporal, e não intelectual. Não se pode querer que um esportista pense e aja como um sociólogo, por exemplo. São as antípodas dos tipos de inteligência.

A tarefa de pensar o futuro de uma nação cabe aos intelectuais, dentre eles, os sociólogos, os educadores, os economistas, os políticos, os empresários etc., jamais aos esportistas. A tarefa deles é outra: cuidar do corpo e obter o melhor desempenho possível, cada um no seu esporte.

Na minha opinião, a Copa e a Olimpíada não apenas vão deixar um legado maravilhoso para o Brasil como eu creio piamente que o Brasil vai ganhar a Copa e liderar o quadro de medalhas da Olimpíada!

segunda-feira, novembro 21, 2011

A culpa não é só da Justiça!

Infelizmente, a invasão do gramado por parte de torcedores delinqüentes é uma coisa relativamente comum no futebol brasileiro. Sempre que isso acontece, uma miríade de jornalistas declaram que a culpa por essa situação é da Justiça, que geralmente não pune com rigor esse tipo de delinqüente. Porém, na minha opinião, a imprensa também tem a sua parcela de culpa, pois raramente os jornalistas acompanham os desdobramentos desses casos.

Não me lembro de ter havido, recentemente, nenhum repórter, esportivo ou mesmo policial, rastreando o paradeiro desses delinqüentes. Assim sendo, paira no ar uma deliciosa sensação de impunidade para os torcedores delinqüentes que quiserem pular o alambrado na próxima partida.

Que a polícia prende e a Justiça solta, isso é fato. Muitos juízes adoram soltar bandidos da cadeia por qualquer razão, ou mesmo sem razão. Enquanto um marginal não matar um filho dele, esse tipo de juiz não muda de atitude.

Em suma, cabe à imprensa, que tanto gosta de se dizer o Quarto Poder, o dever cívico de investigar os procedimentos da polícia e do Poder Judiciário para com esses bandidos.

domingo, novembro 06, 2011

Quais são as funções do Estado?

A seguir, a transcrição de uma palestra do sociólogo Demétrio Magnoli na qual ele fala sobre o tamanho do Estado brasileiro e como a grande maioria da população brasileira enxerga esse tamanho:

Eu vou discordar do consenso de que a idéia de reduzir o Estado é uma boa idéia. Quando falamos sobre o Estado, falamos, por exemplo, sobre segurança pública. O Estado é grande em segurança pública no Brasil? Eu não vejo sentido nessa pergunta, pois ela não tem resposta. Num morro aqui no Rio, o Estado é mínimo em segurança pública, a não ser que a gente considere que a gente considere que o “Estado do B” é o Estado, pois o Estado tem tanto a “polícia do A” quanto a “polícia do B” no morro, e relações com a “polícia do C”, que é o narcotráfico. Nesse caso, eu não acho que o problema seja o tamanho do Estado.

Em certos lugares de muitas cidades do Brasil, existem bairros imensos com pouquíssimos postos de saúde. Deveria haver mais postos de saúde, e não menos. O Estado está sendo mínimo.

Se você olhar para as escolas públicas da maioria do Brasil, elas são ruínas. O Estado lá é mínimo. É um Estado arruinado. São vidros quebrados e professores que não vão dar aula. Esse Estado é mínimo.

Por outro lado, a Eletrobras, a Petrobras, as atribuições dessas estatais, enfim, isso é imenso, isso é um escândalo, isso é um exagero.

Eu acho que o Estado tem funções. Eu acho que seria importante, politicamente, definir essas funções. Ao contrário de outras pessoas aqui, eu acho que o Estado tem a função de assegurar a educação pública para as pessoas, e de boa qualidade. Eu acho que ele tem uma função na segurança. Eu acho que ele tem uma função crucial na saúde. Eu acho que, do ponto de vista da eficácia do discurso político, dizer: “O nosso Estado é máximo; precisamos de um Estado mínimo” é jogar toda a população nas mãos de quem quer um Estado máximo, ou seja, o capitalismo de Estado. Para a população, esse discurso não faz sentido.

Para a maioria dos brasileiros, não faz sentido dizer que o nosso Estado é máximo, porque, para eles, é mínimo, porque não tem segurança, não tem postos de saúde, e por aí afora. Então, do ponto de vista político, eu acho que o discurso de quem se opõe ao capitalismo de Estado e ao autoritarismo que vem junto com ele deveria ser: “O nosso Estado serve para beneficiar o grupo dos amigos do poder, e o nosso Estado deveria beneficiar a população, que paga impostos. O nosso Estado teria que fazer isso, aquilo, aquilo outro, e fazer muito bem”. Esse discurso teria um apelo popular. O povo quer um Estado que atenda as suas necessidades, mas a sua necessidade não é articular um bloco de poder político e econômico em torno de empresas estatais. Isso não é uma necessidade do povo.

O cenário político do Brasil não é um no qual a população que vota esteja disposta a dizer: “Deve-se privatizar os serviços públicos”. A população que vota é pessimamente atendida pelos serviços públicos. Já a Odebrecht é bem atendida pelas concorrências. A população que vota é abandonada pelos serviços públicos, e ela paga impostos extremamente altos. Qualquer um que pretenda se opor ao capitalismo de Estado deveria apelar à população para que os impostos que ela paga se revertessem em excelentes serviços públicos, e não num capitalismo de compadrio, não no desvio de dinheiro para o grupo de amigos do poder, não para alimentar câmaras de vereadores milionárias por aí, não para criar municípios ou até Estados.

Falando sobre educação, me preocupa muito quando se trata o tema da educação como um outro serviço público qualquer, e se trata esse tema como um tema que deve se subordinar a considerações da economia. Então, se explica que uma série de agentes privados poderiam fazer a mesma coisa que o Estado faz na educação por um custo menos e com eficiência maior. Então, você subordina toda a discussão da educação a uma discussão econômica de eficiência. Quem defende isso não entendeu o que é uma nação. A nação não é isso. A nação tem a ver com história, não só com economia. A nação é uma comunidade imaginada, é uma coletividade que imagina que tem um passado comum e um futuro comum. Quando se fala em educação pública, ela surgiu no curso do nacionalismo. Ela surgiu para sustentar a imaginação da existência da nação. O imaginário da existência da nação é sustentado pela educação pública, que produz o nosso passado, que fabrica a nossa tradição, fabrica as nossas datas, os nossos mitos de origem e por aí afora. É por isso que a educação é pública. Não é porque isso é mais eficiente economicamente.

Me preocupa um pouco quando se faz uma discussão que não leve em conta a importância extraordinária do Estado do ponto de vista político para a maioria da população e a importância extraordinária do Estado para certas funções simbólicas que ele deve cumprir. Eu acho que se se levasse essas coisas em conta, haveria mais chance de ganhar os eleitores para atacar o verdadeiro monstro: uma elite política que se entrelaça com uma elite econômica, eliminando a fronteira que existe entre as duas. É importante focar no verdadeiro monstro.