domingo, setembro 03, 2006

A ética de Macunaíma e o cristianismo torto de Apolinário

No início desta semana, assisti a parte do debate entre os candidatos ao governo de São Paulo, transmitido ao vivo pela TV Band. No terceiro bloco do debate, o mediador, Fernando Vieira de Mello, explicou aos debatedores que aquele seria o bloco em que os candidatos fariam perguntas uns aos outros. Quando chegou a vez de Plínio de Arruda Sampaio, candidato a governador pelo PSOL (Partido Socialismo e Liberdade), escolher a quem dirigiria sua pergunta, ele decidiu perguntar a Carlos Apolinário, candidato pelo PDT (Partido Democrático Trabalhista), qual seria a sua plataforma de governo na área econômica. Apolinário respondeu: Esta continuação do modelo neoliberal pelo Governo Lula está aumentando o abismo social entre ricos e pobres no Brasil como um todo, inclusive no Estado de São Paulo. Basta tomarmos como exemplo os lucros-recordes dos bancos nos dias de hoje: enquanto os banqueiros ficam cada dia mais ricos, mais cidadãos brasileiros despencam da linha da pobreza, tornando-se cada vez mais miseráveis. Porém, convém esclarecer que a solução para o triunfo do combate às desigualdades não é, em hipótese alguma, aumentar a carga tributária, pois ela já está pesada demais, e sim tomar dinheiro dos bancos". Ao ouvir esta declaração, desliguei a televisão, deitei-me no sofá em que estava sentado e pus-me a pensar não no que ele disse, e sim no que ele quis dizer.

Antes da minha análise, cabe um lembrete: Apolinário é pastor evangélico. Chamo-o de evangélico porque chamá-lo de protestante seria uma heresia, uma ofensa ao verdadeiro protestantismo, uma vez que as igrejas evangélicas que se proliferam no Brasil há mais de década, salvo raríssimas exceções, não têm quase nada a ver, em termos doutrinários, com o tradicional protestantismo euro-americano, fundado sob os princípios da moral capitalista, responsável pelo sucesso de nações como os Estados Unidos, que são o melhor exemplo de como a ética protestante (e não evangélica) e o espírito do capitalismo têm tudo a ver.

Traduzindo o que estou querendo dizer para uma linguagem mais simples e mais objetiva, o que, afinal, quis dizer Apolinário? Antes de responder a esta pergunta, analisemos a idéia de "tomar dinheiro dos bancos": os lucros dos bancos são propriedade de seus donos e acionistas, e de mais ninguém. Assim sendo, tomar seus lucros seria apropriar-se indevidamente de sua propriedade, isto é, roubar.

Estou acusando um sacerdote de ser ladrão? Sim, pois quem rouba é ladrão, nem mais nem menos; pouco importa se se trata de um sacerdote. Ele é um homem como outro qualquer, com os mesmos direitos e deveres. Porém, o fato de Apolinário ser sacerdote é um agravante do crime de roubo, afinal, ele está dando um péssimo exemplo ao seu rebanho. Em outras palavras, ele está pecando perante Deus e delinqüindo perante os homens. Ele delinqüe perante os homens ao pregar o crime de roubo, e peca perante Deus por sentir - e pregar - o pecado capital da inveja. Portanto, ele é duplamente, ou melhor, triplamente criminoso, pois está delinqüindo e pecando em pensamento, em verbo e, se eleito for, delinqüirá e pecará em ação.

O que diria Max Weber se observasse o avanço do evangelismo, isto é, do cristianismo macunaímico, no Brasil? Certamente, ele escreveria um livro chamado A ética de Macunaíma e o espírito do evangelismo. O que faria Martinho Lutero, líder da Reforma Protestante, se tomasse conhecimento do que se passa com o pseudo-protestantismo que campeia no Brasil de hoje? Certamente, ele faria vistas grossas aos crimes da Igreja Católica de então e continuaria conduzindo sua diocese como se nada estivesse acontecendo; isso sem falar nas 95 Teses, que ele certamente queimaria de desgosto ao ver que sua reforma seria em vão.

E para finalizar, o que falar de Jesus Cristo, então? Se ele voltasse à Terra e ouvisse a retórica sofismática e delinqüente de Apolinário, certamente diria a todos os cristãos do mundo: "Eu não sou cristão!"

Um comentário:

Anônimo disse...

é verdade, os evangélicos brasileiros não sabem do que se passa. mas numa coisa eu concordo com o tal pastor: os bancos estão lucrando demais, e isso é certamente uma anomalia.